segunda-feira, 1 de agosto de 2011

SIGNIFICÂNCIA E SUBJETIVIDADE SUBILIMINAR


Alexandre Lacerda Alves

A observação sistemática do comportamento atualmente preponderante da sociedade moderna me leva a considerar a significância aparentemente invertida de suas premissas e diretrizes, pois, parece que sua raiz, seu berço mesmo, qual seja, o homem como célula primária da gênese da própria civilização e, consequentemente, da sociedade que a compõe como parte apenas, parece cada vez ocupar um papel mais restritivo, face ao que é tido como valores dominantes. Engraçado ou lamentável observar é que a conseqüência do problema está na sua própria raiz, no seu cerne propriamente dito. Ou seja, o próprio homem que, ávido por competição e na tentativa de “garantir seu lugar ao sol”, atropelou a si próprio, seus próprios sonhos, quando deixou de cultivar valores emocional-afetivos, morais/éticos, para simplesmente ter de ser, enquanto poderia escolher poder ser. Logo, um dos grandes dilemas da filosofia moral pode ser resumido nas seguintes questões: Existem ou não valores morais válidos para todos os homens? Como justificar a classificação das ações em moralmente corretas ou incorretas, boas ou más? O que preocupa é que reconditamente, mas com firme avanço as pessoas (olhando de maneira maximizada e generalizada apenas), se deixam perder nestes objetivos paradoxais, porque se enquistam de medos e formulações defensivas daquilo que as poderia libertar deste ciclo, enquanto não se apercebem de que, desta maneira, na verdade enceguecem a razão, obscurecem o discernimento e acabam por ficar aprisionadas na não liberdade do pensar e do sentir. Acabam por tolher, quando não limitam e/ou mutilam sua potência criadora, pois a liberdade existencial ficou perdida no tempo gasto em se transformar em “coisas” cuja identidade está perdida, tornando-se amarguradas e às vezes pessimistas, combativas, quando este comportamento bifurcado suga-lhes a energia de viver, tornando-as ainda mais defensivas e perseguidoras de sucesso, como se essa fosse a nova panacéia capaz de suprir aquilo que a simplicidade do coração humano perdeu para a complexidade de conceitos e metas auto-impostas a cada dia. 

Não quero preconizar que este seja o fim ou que esta decadência de princípios seja o novo paradigma dos dias atuais, até porque, muito se tem criado de positivo. Mas, quando se observa a maioria, como ela reage como “massa”, pergunto-me onde o “indivíduo” que se potencializa na realização pluralizada, no conjunto. Por que tanta solidão, tantas angústias manifestas no anonimato de sorrisos vazios e/ou de maculados brilhos que ferem o brio da sensibilidade seqüestrando o que deveria ser na verdade um aspecto simples e transitório do viver e tornou-se algo maior, tão subjetivo que sequer o entendemos mais. Onde as alegrias simples que purificam o coração? Porque preterir esse estado de felicidade pueril à ditadura de conceitos endurecidos? para que essa ‘engrenagem’ social possa continuar como boca faminta a tragar mais e mais incautos corações? Creio ainda que na nossa essência precisemos de muito pouco para transcender, expandir-nos de maneira tal que o estado de felicidade possa alcançar nosso caráter objetivo das coisas. Mas, creio igualmente que seja necessária a mísera coragem de nos desapegarmos do racionalismo complexo que criamos para defender tais posturas e postular um modo mais aberto, com menos mecanismos engenhosos de defesa contra aquilo que na verdade me parece a nossa essência, ou seja, nossa humanidade, que grita por mais espaço e liberdade, tão suprimida está por isso tudo. 

A conexão com os outros precisa deixar de ser percebida como competição adicionada. Como marco de superação um contra o outro e porque não, contemplar como elemento e maior empatia regeneradora, mais energização pelo que podemos nos oferecer e não subtrair. Assim, nessa soma, nos engrandecemos, alçando vôo para a plenitude dessa humanidade que ficou tão acanhada... irrisória em nossa miserabilidade criada e sustentada por um coletivo distorcido e deturpado. Sinto que precisamos encontrar-nos mais com nós mesmos, cuidar das feridas uns dos outros, expressar nosso afeto, abrir espaço para as demonstrações empíricas e concretas dos nossos sentimentos, porque a inteligência tão somente experimentada já provou que pode gerar mais aridez que fecundidade, afastando as pessoas e gerando ainda mais desolação. Mas, é preciso coragem para reconhecer isso, porque na inversão de valores em que vivemos isso é percebido como fraqueza dialética e pragmática. 

Nossas idiossincrasias deveriam voltar-se para o cultivo da alegria de compartilhar, da magia de dividir para somar, de nos fazermos mútuos, unos. Capazes de uma coletividade mais assegurada e asseguradora do que somos, multiplicando nossos conceitos primários em força secundária, capaz de nos sustentar em uníssono humano criador e gerador de apoio mútuo. Dentre essas características existem duas problemáticas. São: o “eu dividido” e o “eu individual”, pois na primeira as duas faculdades estão separadas, porém devem estar unidas para poderem juntas serem base para a vontade racional. E na segunda característica, o objetivismo vê o eu como tendo uma essência fixa, mas não há alguma “coisa” estática que é ou deva ser, que determina o que o agente moral deva fazer. A identidade de alguém como agente moral muda e é moldada pela forma de alguém deliberar sobre seus fins e propósitos. Ainda penso que, o erro emotivista é afirmar o eu dividido – a bifurcação de razão e desejo – e depois colocar a moralidade fora da razão. A moralidade não é prática porque, por si mesma, não pode nos mover à ação, pois a moralidade não tem nada com as qualidades objetivas de ação ou caráter, mas somente com nossa resposta sentimental quando contemplamos tais ações ou estados de caráter. Tal concepção depende da aceitação de uma estrutura conceitual incompatível com os resultados recentes das ciências cognitivas. Captura pouco da nossa experiência como seres humanos e descuida dos aspectos básicos das situações morais problemáticas particulares. Negligencia uma concepção de moralidade como exploração das possibilidades do florescimento humano, isto é, uma concepção expansiva e construtiva e não negativa e restritiva. Por isso dividimos, enfraquecemos, afastamos, singularizamos ao restringir nossos objetivos e trazer nossa capacidade quase infinita de sentir para grupos cada vez menores, revelando uma obsolescência crua do deveria ser maturidade plena dos nossos sentidos. 

Se fizermos uma reflexão mais honesta sobre estas observações, admito que as conclusões podem (e devem ser diversas), inobstante isso, porém, há pontos de coesão que merecem uma observação mais detida, pois no mínimo não deixa de representar uma autocontradição humana. Nós buscarmos tanto a qualidade de vida entronizada por estes valores contemporâneos e para isso deixarmos de lado o elemento fundamental: nossa humanidade, com quase tudo que ela tem de mais rico, ou seja, sua fragilidade que nos leva a buscar a capacidade de superação e o desenvolvimento das nossas virtudes mais verdadeiras. Pensemos nisso. Mas não como pensamos de forma geral, relativizando as questões. Pensemos de forma viril, consistente, confiante; porque com certeza a resposta, de tão concernente nos surpreenderá: para vivermos os dias de hoje por nossas próprias regras, deixamos de viver pelas regras da vida. O ser humano é apaixonado e apaixonante e não se convenceu ainda que sua essência é emocional, derivando para o intelectualismo, domado pelos sentimentos educados pela ética individualmente assimilada a partir do autoconhecimento e do aprendizado externo, pois, somente desta forma ele poderá ter chances de eliminar tais dogmas e conflitos, sejam eles subjetivos e/ou relativos, sejam eles brumas circunstanciais ou densas nuvens existenciais persistentes e pressupostas no seu modo de “pensar” a vida, pois a verdade, na sua maior acepção é simples: as paixões e a razão exercem força sobre a vontade que por sua vez exerce força sobre o corpo e as ações. A vontade pode resistir à força exercida pela razão e, muitas vezes, à força exercida pelas paixões. As paixões e a razão exercem forças opostas. Entendido isso, cria-se liberdade real, gosto pela experimentação, potência humana que gera amadurecimento, capacidade de discernimento mais claro e simples, menos angústias e agonias incompreendidas, mais chances de inverter valores e caminhar com maior segurança para algo que se quer de fato. Não para aquilo que imaginamos querer a partir do “self” coletivo, tanto quanto, a partir do imaginamos que somos e podemos a partir das nossas experiências e limitações. Afinal, do que é realmente capaz o ser humano? E, este paradoxo,deixará de nos consumir e anular. Porquanto, a verdade é tão mais simples. Tão menos objetiva, tão mais sensível e bela. A verdade somos NÓS. E como isso é apreciável.